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PARTE DA PAISAGEM
Recolhimento, concentração, precipitação. Ou, pelo contrário, exposição, soltura e dispersão. Nestes poemas, como num espasmo, a abertura inquieta desemboca muitas vezes no espanto de quem subitamente para, sabendo que as palavras serão os resíduos, apenas, do quase indizível. É um mundo de quases, que os leitores já terão aprendido a apreciar nas vozes que guiam os personagens de Adriana Lisboa, alheios aos gestos heróicos e afeitos à elaboração vasta, porém breve, da música que soa ao fundo, tanto na prosa como na poesia. Na recusa da expressão brilhante, um discreto fio melancólico avança e faz do poema lugar de espera e escuta: espaço do envelhecimento, não fosse um outro fio de vida que se enlaça àquele, teimando em recordar que, quando bem quisermos, podemos saltar do vagão, aliviando-nos do peso inominável do fim da viagem. Aí, justamente, aportaremos numa espécie de Pasárgada às avessas, lugar onde o rei não é rei, e tampouco sei se terei as mulheres que quero. Paisagem, em suma, incapaz de prometer outra vida; lugar de passagem, percurso que a delicadeza da poesia insiste em propor, mostrando tão só o que existe, em sua face ora sombria, ora insuspeitadamente luminosa. O que resta, restará sem adornos ou circunspeção, só vida gratuita. Não se trata da delicadeza não-me-toques, da afetação de quem mal resvala no mundo. Na poesia de Adriana Lisboa, delicado é o elemento que decantou, após vagar por uma solução em que o desvio e os choques levaram a uma nova e inesperada composição. Mas, ainda aqui, não se fala da delicadeza ostentatória de um cristal definitivo, ou do sólido que podemos ver apalpar e admirar. Em “Parte da paisagem”, o que se projeta é o instável e delicado equilíbrio em que corpo e alma, juntos, descobrem-se a ponto de cair.
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