República das rosas
Logo nas primeiras páginas deste livro, o autor define seu projeto: "uma obra de ficção sobre a descoberta do amor, ancorada em fatos históricos". Sabemos que toda produção ficcional revela pegadas da vida do autor, mas nesse caso seria mais acertado dizer que se trata da biografia de uma geração in progress ou, melhor dizendo, in regress.
Embora datada em décadas - abarcando o percurso dos anos de chumbo da ditadura militar num país chamado Eldorado - mais do que o registro de uma época assolada por desmandos autoritários, sua prosa nos conduz pelo fio de uma narrativa sensível sobre a sina de uma geração marcada por turbulências sociais. A ditadura militar funciona como fio condutor, mas não é o foco da narrativa.
De fato, o verdadeiro protagonista desta "República das Rosas" é a geração que adolescia nos anos 1960/70, nesse país tão imaginário quanto seu sonho de libertação. O autor maneja as ferramentas da narração com a voz de quem viveu a história. Sua prosa poética vem permeada de um humor crítico, um olhar mordaz, lançado nos dias de hoje, sobre os tempos idos e vividos naquele período, entre a cruz e a espada. Em contraponto - e pra não dizer que não falou de flores - não se exime de realçar a beleza das meninas, a descoberta do amor, o mar azul de Acapulco e os prazeres da vida, apesar dos pesares.
No final, o enredo nos provoca uma sensação de desalento por tantas perdas e desvios do sonho original, o ideal da felicidade coletiva, perdido nos desvãos da história. Mas o autor-protagonista continua acreditando que outro sonho seja possível.
Estamos diante de um texto literário de rara inspiração, apurada em linguagem poética que nos emociona a todo momento, nos faz sentir, pensar e produzir a partir de sua matéria-prima.
Domingos Cunha