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Um dia chegarei a Sagres
"Nélida Piñon não publicava um romance inédito desde o premiado Vozes do deserto, de 2004. Um dia chegarei a Sagres é, portanto, per se, um acontecimento literário. A autora nos oferece um épico poderoso, passado no século XIX, em um Portugal profundo, produto da fé na tradição oral e na cultura da memória.
Nélida move-nos - tendo Mateus, o narrador, como corpo; e Camões, o norte, como alma - pela terra, pelo chão que é também rio, até que a estrada seja o mar. A viagem - o lançar-se - é destino daquele povo.
A represa - um mar inteiro a atravessar - é Vicente. O avô. Aquele que criou Mateus, filho da meretriz e neto de pai desconhecido. Um neto que encarna o campo português. Na trama íntima, plena de pujança, essas relações, em que a secura de gestos e palavras se impõe, Nélida Piñon faz desaguar alguns dos elementos que compõem o imaginário de sua ficção: não apenas a aldeia, mas o universo da aldeia; não apenas os animais, mas a sacralidade dos animais; não apenas Deus, mas a presença de Deus; não apenas o sexo, mas o sexo que rege o instinto indomável.
Vicente, o cético, morre; é a represa levantada. Mateus vai, um Vasco da Gama inteiro em seus desejos. A aldeia fica. Mateus, desde o alto da colina de São Jorge, uma nesga de Tejo a ver, narra. Narra Amélia, a mulher do Oriente; quem sabe a esperança? Ainda Vicente, memória do passado, o legado do Infante D. Henrique. Sempre sob a fantasia eterna, obsessão de um dia chegar a Sagres.
Narra a história de Portugal - de uma civilização - na saga do indivíduo, um camponês talvez intrépido. Impossível não encontrar no caráter deste fascinante épico de Nélida Piñon - deste livro de século - um novo A república dos sonhos, romance que é marco da literatura em língua portuguesa
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